segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Parnasianismo


 "O Parnasianismo foi vítima da inteligência que construiu a prisão onde quis encarcerar o poeta." 
 --Rubens B. Morais
Originariamente da França, é a poesia que segue os princípios da estética realista. Apesar disso, ideologicamente os romancistas realistas e naturalistas não tinham exatamente os mesmos propósitos da manifestação poética desta época.
O movimento recebe esse nome por causa de uma antologia, Parnasse Contemporain, publicada a partir de 1866, na França, essa incluía poema de T. Gautier, de Lecomte de Lisle e outros. Esses poemas revelavam gosto da descrição nítida, metrificação tradicional, preocupação formal e um ideal de impessoalidade.
Embora acompanhe cronologicamente a prosa realista, a poesia parnasiana apresenta dificuldades na definição de seu marco inicial. Há quem sugira a data de 1880, quando da publicação de Sonetos e Rimas de Luís Guimarães Júnior (1845/1898). Outros, no entanto, preferem assinalar a de 1882, quando Teófilo Dias publicou Fanfarras. Mas o movimento só se definiu realmente a partir de Sinfonias (1883) de Raimundo Correia, seguida de Meridionais (1884), de Alberto de Oliveira e de Poesias (1888) de Olavo Bilac.
Quanto à data que marca o fim de seu domínio absoluto, parece não haver polêmicas: 1893, com a publicação de Missal e de Broquéis de Cruz e Souza é bastante aceita. Mas a morte do Parnasianismo não acontece, tanto que algumas obras surgem após 1922).
Formação em Medicina, o menino Bilac teve sua infância povoada de histórias de batalhas e hinos militares, pois seu pai participara da Guerra do Paraguai. Após 1888, com a publicação de Poesias, passa a dedicar-se ao jornalismo e à literatura.
Defendeu o serviço militar obrigatório, como fator de civismo, e alfabetização. Foi um patriota convicto; é dele a letra do Hino à Bandeira. Foi defensor do abolicionismo e da República e colocou-se contra a ditadura de Floriano Peixoto (exilado em Ouro Preto por suas críticas). Foi contra a neutralidade do Brasil na guerra de 1914. Sempre escreveu para a imprensa, tendo colaborado no jornal A Gazeta de Notícias e em revistas: A Semana, A Cigarra etc.
Único parnasiano que já se iniciou na estética do movimento, Bilac foi um dos fundadores da A.B.L.; foi eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros.
Obras Principais:
  • A sua poesia pode ser dividida em temas:
    • volta a Antiguidade Clássica - Panóplias= armadura de um cavaleiro medieval, “A Sesta de Nero”, “O Incêndio de Roma”, “Lendo a Ilíada” e outros.
    • lirismo - 35 sonetos de Via Láctea
    • lirismo mais sensualista - soneto “Nel Mezzo del Camin... (cheio de pleonasmos e inversões)
    • filosófico, de meditação - Alma Inquieta e Viagens
    • épico - no poema “O Caçador de Esmeraldas”, de Viagens (bandeirantes em terras mineiras)
    • descritivo e nacionalista - “Crepúsculo na Mata” (descritivo), “Anchieta” e “Vila Rica” (volta ao passado histórico)
    • “Tarde” é o soneto da consciência do fim, proximidade da morte - crepúsculo do poeta
  • Prosa
    Crônicas e Novelas (1894), Crítica e Fantasia (1904), Contos Pátrios (1905, em colaboração), Teatro Infantil (1905), Tratado de Versificação (1905, em colaboração com Guimarães Passos)
    Conferências Literárias (1906), A Defesa Nacional (1917, discursos), Ironia e Piedade (1916), Bocage (1917), Últimas Conferências e Discursos (1927), Livro de Leitura (1899).
    A mulher e a pátria são temas constantes na obra de Bilac.
    Coerente com sua postura estética, sua forma é perfeita, demonstrando habilidade de versificação e pureza da língua. Sua poesia é superficial como visão do homem, pois se detém na camada superficial das cores, dos sons, das combinações plásticas sem mergulhar nas angústias e prazeres do ser humano.

 Via Láctea - Soneto XIII
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" Eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."
 
 --Bilac
Formação em medicina, mantém profunda amizade com Olavo Bilac e Raimundo Correia. É um dos sócios fundadores da ABL, sendo também eleito Príncipe dos Poetas após a morte de Bilac.
Sempre permaneceu fiel ao Parnasianismo e à margem dos acontecimentos históricos. É considerado mestre nessa estética, com sua temática presa à descrição, desde a natureza até meros objetos, exaltando-lhes a forma. Perfeição formal, métrica rígida e linguagem extremamente trabalhada, chegando, por vezes, ao rebuscamento.
Obras Principais:
  • Estreou em 1878 com as Canções Românticas de inspiração romântica, como bem demonstra o título, mas em 1884 publica o seu segundo livro, Meridionais, em que se confessa adepto do Parnasianismo.
  • Suas obras principais são: Sonetos e Poemas (1885), Versos e Rimas (1895), Poesias Completas (1900), Poesias (quatro séries até 1927), Poesias Escolhidas (1913).
  • Sua obra revela uma gradativa evolução, passando de uma linguagem difícil, vinculada aos temas exóticos de mitologia greco-latina para uma linguagem mais clara e ligada aos temas brasileiros. Revela um gosto especial pela descrição, como nos poemas “O Muro”, “A Estátua”, “O Vaso Grego” etc. Em sua obra, a mulher e a natureza são vistas a partir de uma concepção estética muito rígida.

 Vaso Grego
Esta, de áureos relevos, trabalhada
De divas mãos, brilhante copa, um dia,
Já de aos deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

Era o poeta de Teos que a suspendia
Então e, ora repleta ora esvazada,
A taça amiga aos dedos seus tinia
Toda de roxas pétalas colmada.
Depois. Mas o lavor da taça admira,
Toca-a, e, do ouvido aproximando-a, às bordas
Finas hás de lhe ouvir, canora e doce,

Ignota voz, qual se da antiga lira
Fosse a encantada música das cordas,
Qual se essa a voz de Anacreonte fosse.
 
 --Alberto Oliveira
Formação em Advocacia, lecionou em quase toda a vida. Tem seu livro Sinfonias (1883), completamente parnasiano, publicado com prefácio de Machado de Assis. Também é sócio fundador da ABL.
Era tímido e triste, sua saúde era debilitada, tendo viajado para a França, à procura de tratamento, quando lá encontrou a morte. Poema-epíteto: “As Pombas”.
Forma a Trindade Parnasiana com Bilac e Alberto de Oliveira. Mantém assim a temática do movimento, destacando-se a poesia filosófica, de meditação, marcada pela desilusão, o fim do sonho e um forte pessimismo. Tem fortes influências impressionistas.
Obras Principais:
  • Estreou com um livro de inspiração romântica, Primeiros Sonhos (1879)
  • Firmando-se como parnasiano a partir de Sinfonias(1883).
  • Outras obras: Versos e Versões (1887), Aleluias (1891), Poesias (1898), Luciano Filho (1898 -ensaio).

Afirmam que Raimundo Correia versejava com tanta facilidade que chegava a escrever em verso as cartas aos familiares. Seus poemas revelam influência do pessimismo de Schopenhauer. A sua percepção negativa do mundo pode ser vista principalmente em “Nirvana”, “Imagem da Dor”, “Desiludido”.
 As Pombas
Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas,
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sangüínea e fresca a madrugada...

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...
Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;

No Azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais. ..
 
 --Raimundo Correia
 Profissão de Fé
Le poète est ciseleur.
Le ciseleur est poète.
 
 --Victor Hugo
Não quero o Zeus Capitolino,
Hercúleo e belo,
Talhar no mármore divino
Com o camartelo.

Que outro — não eu! a pedra corte
Para, brutal,
Erguer de Atene o altivo porte
Descomunal.

Mais que esse vulto extraordinário,
Que assombra a vista,
Seduz-me um leve relicário
De fino artista.

Invejo ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.

Imito-o. E, pois, nem de Carrara
A pedra firo:
O alvo cristal, a pedra rara,
O oníx prefiro.

Por isso, corre, por servir-me,
Sobre o papel
A pena, como em prata firme
Corre o cinzel.

Corre; desenha, enfeita a imagem,
A idéia veste:
Cinge-!he ao corpo a ampla roupage
Azul-celeste.

Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.

Quero que a estrofe cristalina
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina.
Sem um defeito:

E que o lavor do verso, acaso,
Por tão subtil,
Possa o lavor lembrar de um vaso
De Becerril.

E horas sem conto passo, mudo,
O olhar atento,
A trabalhar, longe de tudo
O pensamento.

Porque o escrever — tanta perícia,
Tanta requer,
Que ofício tal... nem há notícia
De outro qualquer.

Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir. Deusa serena.
Serena Forma!
(...)

Ver esta língua, que cultivo,
Sem ouropéis,
Mirrada ao hálito nocivo
Dos infiéis!...

Não! Morra tudo que me é caro,
Fique eu sozinho!
Que não encontre um só amparo
Em meu caminho!

Que minha dor nem a um amigo
Inspire dó...
Mas, ah! que eu tique só contigo
Contigo só!

Vive! que eu viverei, servindo
Teu culto, e, obscuro,
Tuas custódias esculpindo
No ouro mais puro.

Celebrarei o teu ofício
No altar: porém,
Se ainda é pequeno o sacritício,
Morra eu também!

Caia eu também, sem esperança,
Porém tranqüilo,
Inda, ao cair, vibrando a lança,
Em pro! do Estilo!
Rio de Janeiro, junho de 1886

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